Tenho vivido nos últimos dias experiências intensas com relação a infância. Algumas revelam o poder da educação na vida das pessoas. O brilho no olhar. Outras demonstram o quanto ainda nos falta caminhar nesta Terra para podermos aprender a valorizarmos a nossa condição de seres humanos.
Mas gostaria de partilhar com vocês algumas experiências não tão alegres, pelo menos até agora. Estamos aqui justamente porque acreditamos que o rumo dessa história pode e deve ser diferente. O que tenho encontrado é desolador. Não é a carência física que assuta. O desamor é o que mais preocupa.Cheguei perto do que considero ser o olho do furacão. Perto do que gera desestrutura de personalidade: a falta de afeto.
Nesta semana mesmo, enquanto ouvia as queixas de uma mãe em relação à filha pude perceber o quanto as carências emocionais que trazemos da infância não se apagam. Ou o quanto temos que trabalhá-las dentro de nós para que o áspero se torne macio, para que a dor possa se transformar em força pra continuarmos vivendo buscando a felicidade. E pude ver nos olhos da mãe ao contar que a filha tem as bonecas que ela (mãe) nunca teve. Pude ver mesmo o olhar da criança que àquela mulher um dia foi diante de mim. Não era mais a mãe quem falava. Era ... uma criança.
Outro caso: Uma criança abandonada aos 4 meses de idade pela mãe. Hoje, aos 9 anos é espancada pelo pai e madrasta. Durante a manhã frequenta a escola, à tarde fica sozinha na companhia do irmão mais velho - também criança. Abandono . Não há nenhum adulto que a acolha. Comportamento oscilante. Reproduz na escola o que vive em casa.
Aos 9 anos já conhece o ódio e fala dele com muita propriedade.
Quando perguntada - Ódio de quem? De quem sentes ódio?
A resposta é mais surpreendente ainda: - De Deus que me deixa viver.
Desolador não é? Mas essa história é real e certamente não é a única em um país como o nosso que tem o descaso do poder público sempre rondando por perto.
A escola tem o dever de trabalhar com essa realidade valorizando conteúdos e experiências de vida que retratem o contexto sócio-histórico e cultural dessas crianças, mas, de modo a valorizar potencialidades, valores e principios sociais que devem ser resgatados, construídos ou mesmo desconstruídos pelos grupos. Não há receita. Apenas temos que ter consciencia que os pontos de partida e chegada no processo educacional deve ser a realidade do sujeito em questão.
É urgente que façamos uma revolução educacional, mas, para isso não temos que esperar os pilares da edcucação nacional ditarem por onde deveremos seguir, os passos que deveremos dar. A revolução deve começar JÁ, agora. Na sala dos professores, nos corredores, no refeitório, na formação continuada. Na sala de aula. Poderá ser um uma gota no oceano, mas, que seja MUDANÇA.
Não podemos ficar paralisados diante do descaso familiar, do abandono, da falta de estrutura, ou melhor dizendo paralisados diante da desestrutura generalisada e cada vez mais complexa das famílias. Alguém pode estar pensando agora, mas, a escola não tem obrigação de dar jeito nisso. A obrigação é da família em prover o sustento dos menores, posição da qual concordo plenamente, mas, a realidade é que milhares de crianças ainda contam com o lanche da escola para forar seu estômago. E aí? O que fazer diante dessa realidade concreta?
As respostas a essas questões podem ser encontradas no "currículo". O curriculo merece significativa atenção. Significativa atenção merecem a estrutura curricular dos cursos de formação de Pedagogia para que estejam em consonância com uma prática pedagógica fundamentada e em sintonia com uma educação popular legítima. Significativa atenção merecem as múltiplas realidades sociais existentes em nosso país. Prestar mais atenção e valorizar no cenário escolar a criança, seus desejos, medos, esperanças, sonhos ... e em uma infância que de repente, acaba.
A criança é uma pessoa, um ser humano que produz, que é capaz, que quer ser feliz, que tem os mesmos direitos do que aqueles que dormem acolhidos em um lar amoroso, com ternura e afeto.
O que estamos fazendo com as nossas crianças?
PARTILHANDO ESPERANÇAS
ESPAÇO DE DIÁLOGO E REFLEXÃO SOBRE EXPERIÊNCIAS EDUCACIONAIS

sexta-feira, 14 de outubro de 2011
quarta-feira, 10 de agosto de 2011
ESCOLA DÁ AULA SOBRE VIOLÊNCIA.
PARTE 1
Há poucos dias soube que uma escola estaria redestribuindo os alunos do ensino fundamental de um mesmo ano em duas salas de aula. O critério a ser utilizado para redestribuição seriam as médias escolares. Então teríamos a classe dos "super poderosos" com suas super médias calóricas e a mesma classe teria sua representação menos robusta, menos favorecida em termos de notas.
Quando perguntei sobre que alegação a coordenação apresentava para essa patética classificação, fiquei mais abismada ainda. Segundo meu interlocutor seria porque os professores reclamavam muito do comportamento dos "potencialmente desnutridos educacionais". Afinal de contas, os pobres professores tinham que se desgastar em demasia para dar explicações infindáveis aqueles que não conseguiam acompanhar os conteúdos trabalhados e rapidamente absorvidos pelos "super poderosos".
É inconcebível que esse tipo de conduta se estabeleça em uma instituição de ensino sem que pensemos nas consequências, de infinitas proporções, que essa ação poderá causar entre os alunos, professores e toda comunidade escolar. VIOLÊNCIA ?
Quando identificamos na conduta das crianças e jovens um comportamento discriminatório (absorvido nas relações sociais, geralmente apreendidas na família), achamos que a escola deve atuar de forma mais contundente de modo a pacificar e minorar ou mesmo eliminar de vez esses comportamentos. Agora o que dizer quando a própria escola é descriminatória e rotula seus alunos porque é mais fácil fazê-lo assim. É mais fácil "resolver" o problema empurrando a sujeira pra debaixo do tapete. É mais fácil conceber a aprendizagem como produto que encontramos nas prateleiras dos super mercados. Compramos, nos apropriamos e pronto!
Aprendizagem é processo. Tem ritmo próprio. Alimenta-se de estimulo, motivação, flexibilidade, possibilidades, planejamento, compromisso, diálogo, significação e de uma série de outros fatores estabelecidos pelo contexto cultural, social, econômico, político e tantos outros elementos existentes na realidade de cada um de nós.
O que vocês acham dessa história que acabei de contar? É real? É ficção?
Aguardo suas críticas e sugestões. Poste um comentário.
Participe!
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sexta-feira, 5 de agosto de 2011
O DOUTOR E O ANALFABETO
Foi num rio qualquer do Estado do Pará, Amazônia, Brasil. Pode ter sido no Guamá, no Tapajós, no Moju, no Acará, no Araguaia, no Tocantins, no Xingu, no Trombetas, no próprio Amazonas... É... pode ter sido em qualquer um, não faz diferença. O que conta é a história em sí.
- Cumentão, dotô? Formado? o que é isto?
- Que Faculdade tu cursaste?
- Ara, mas, doutô! Eu não cursei Facurdade nenhuma. Mas, ara ...
- Perdeste mais dez anos de tua vida...
O caboclo fez as contas - isto ele sabia fazer - e viu que já tinha perdido trinta anos da vida dele...
Olhava o doutor com admiração, mas ao mesmo tempo já chateado de tanto estar perdendo anos de sua vida por não ter estudado ... E o doutor, implacável fez ainda mais uma pergunta:
TEXTO EXTRAÍDO DO LIVRO: HISTÓRIAS BRASILEIRAS E PORTUGUESAS PARA CRIANÇAS - WALCYR MONTEIRO E FERNANDO VALE - 2005
Era um doutor, destes metidos a sebo, que, por ser doutor, pensa que tem o rei na barriga e gosta de pisar nos mais humildes.
Estava na margem de um rio paraense, desejando passar para a outra margem. Acercou-se de um cabloco e falou:
- Caboclo, eu quero passar para a outra margem. Qual é a tua canoa?
Nem ao menos perguntou se o caboclo podia ou não atravessá-lo.
Falou imperativamente, e o pobre caboclo indicou, com um trejeito na boca, a direção onde estava sua montaria, na qual o doutor embarcou.
A bem da verdade, não sei se o doutor era de curar, de leis ou de construir. Sei apenas que era um doutor metido a besta e que gostava de humilhar os outros.
Mal a pequena embarcação desatracou, começou a espicaçar o pobre caboclo.
Ele, o doutor, sabia muito bem que o caboclo não tinha instrução.
Mesmo assim, falou:
- Caboclo, tu és formado em quê?
- Que Faculdade tu cursaste?
- Ara, mas, doutô! Eu não cursei Facurdade nenhuma. Mas, ara ...
- Então, perdeste dez anos da tua vida. Mas fizeste o segundo grau, não?
- Mas quar dotô? Não fiz não, isso não tem pros meus lados...
- Perdeste mais dez anos de tua vida. Pelo menos cursaste o primeiro grau?
- Não seu dotô. Mas quando, antão?
- Perdeste mais dez anos de tua vida...
O caboclo fez as contas - isto ele sabia fazer - e viu que já tinha perdido trinta anos da vida dele...
Olhava o doutor com admiração, mas ao mesmo tempo já chateado de tanto estar perdendo anos de sua vida por não ter estudado ... E o doutor, implacável fez ainda mais uma pergunta:
- Mas, caboclo, pelo menos tu sabes ler e escrever?
- Sei não dotô. Purra, eu su anarfabeto de pai e mãe ...
- Pois perdeste mais dez anos de tua vida...
Já eram quarenta anos que o caboclo perdia ...
Estavam bem no meio do rio .
Nesse momento, a canoa começou a fazer água rapidamente e mais rapidamente a afundar.
- Aí o caboclo perguntou para o doutor:
- Dotô, o senhor sabe nadá?
- Não... não ... disse o doutor, apavorado.
- Pois então, dotô, o senhor perdeu a sua vida toda ...!
E saiu nadando em direção à margem, enquanto o doutor morria afogado, com toda a sua soberba ...
sexta-feira, 1 de julho de 2011
A carga histórica e cultural da qual nos vemos cercados quando atravessamos os rios de nossa região nos dá a devida dimensão do poder da floresta sobre nós. Sentimo-nos pequenos diante da grandeza de saberes e identidades expostas de maneira tão avassaladora, num cenário ao mesmo tempo complexo considerando a pluralidade de saberes existentes, e simples se observarmos os modos de vida e subsistência. Uma realidade tão próxima da cidade, mas que nos transporta em poucos minutos no tempo e no espaço para um mundo ignorado pela grande maioria dos que vivem na zona urbana de Belém.
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